O episódio piloto da primeira temporada não deixava dúvidas: estávamos perante um produto televisivo que quebrava a barreira da adolescência parva, romântica e fútil de tantas outras séries televisivas recentes, que focam nas relações amorosas entre as personagens a sua mensagem nuclear. Veronica Mars era uma série homónima sobre uma adolescente de secundário, é verdade, mas tal facto não passava de um elemento de mera contextualização, que enriquecia a complexidade e variedade de mistérios. Havia vidas arruinadas, assassinatos, raptos, homossexualidade, pornografia, drogas e… o vício de ver mais, muito mais. Um costume pouco censurável já que a personagem interpretada pela cativante Kristen Bell era dotada de uma inteligência única e vivaz, que acalentava e incentivava o mais sórdido dos espectadores a descobrir os enigmas de cada episódio. E, peça por peça, o mistério final.
Sinopse Inicial
Veronica é uma adolescente que, nos seus tempos livres, ajuda o pai no escritório. Agora detective privado, mas outrora Xerife de Neptune, Keith Mars (Enrico Colantoni) é um pai dedicado que trata da filha sozinho, depois de toda a sua vida ter dado uma volta de cento e oitenta graus, por ter acusado uma das famílias mais poderosas da cidade do assassinato de Lily Kane, a melhor amiga de Veronica. Provado que estava errado – mas será que estava mesmo?!? -, Keith foi obrigado a entregar a sua insígnia… e a sua reputação. Veronica é, por isso mesmo ostracizada pelas elites, mas não se importa. O seu pai é o seu herói, e está na hora de provar que é ele quem tem razão.
Criação do Culto
Uma narração personalizada, num tom muito “noir”, serve de catapulta para uma aventura de identidade própria. Através de imagens ligeiramente desfocadas, com cores baças e perspectivas interessantes e sombrias, escoltadas por recordações pouco densas sobre uma violação misteriosa e uma iluminação singular de bradar aos céus, Veronica Mars é muito mais do que simples um drama adolescente. É um drama sobre adolescentes que não são estereotipados: o bom não é tão bom como se pensa e o mau não é tão mau como parece. E é ao respeitar a audiência com esses limites cinzentos – não há branco nem preto – que Rob Thomas, criador da série, triunfa. Tudo é honesto em Veronica Mars, mas nada é facilmente descodificado. Com nervos de aço e fria como o gelo, Veronica, interpretada magistralmente por Kristen Bell – que, faça o que fizer agora na sétima arte, ficará eternamente ligada a esta personagem – não sabe dizer “não” a ninguém. Na sua dicotomia entre o que deseja que aconteça e o que realmente acontece nos casos em que investiga (e muitos são os que o faz por mera curiosidade), Mars transforma a narrativa numa elipse negra e dramática, requintada quase sempre pelo humor apimentado e mordaz dos seus protagonistas – seja o da própria, ou o de Logan e Keith. Com várias referências à cultura Pop norte-americana, uma banda sonora actual e variada e uma relação pai/filha genuinamente credível, Veronica Mars, a série, será para sempre recordada como uma das melhores da história recente da televisão. Opinião unânime, acreditem.
Kristen Bell
De descendência polaca e irlandesa, Kristen Bell não é tão nova como a sua personagem na série testemunhava. Veronica Mars era uma adolescente de dezassete anos aquando da estreia da série, em 2004, mas a verdade é que Bell já contava com vinte e quatro celebrações no bolso nessa altura. Vegetariana – e considerada por isso mesmo pela célebre organização de defesa dos animais “PETA”, por dois anos consecutivos, como a vegetariana mais sexy do planeta -, Bell começou a sua carreira no teatro, em importantes peças como “The Adventures of Tom Sawyer” ou “The Crucible”, de Arthur Miller, onde contracenou com Laura Linney e Liam Neeson. Com os primeiros papéis secundários no cinema – a maioria em comédias baratas -, o talento e a beleza de Kristen começaram a dar nas vistas. Quando foi convidada para representar uma personagem sua numa peça de teatro, mas desta vez na sua adaptação ao cinema, os olhos de Hollywood caíram sobre si. Tratava-se de “Reefer Madness: The Movie Musical”, uma versão renovada e equiparada a “The Rocky Horror Show”. Seguiu-se “Veronica Mars”, o papel principal em “Pulse”, remake norte-americano de uma das fitas de terror mais lucráveis da indústria asiática e um pequeno papel em “Spartan”, do realizador David Mamet. Com o final de “Veronica Mars”, a série que a catapultou definitivamente para o estrelato, Bell continuou o seu caminho: foi personagem homónima em “Forgetting Sarah Marshall” – não nos relembremos do título nacional -, participou em “Heroes” e ainda hoje é a voz responsável pela locução de “Gossip Girl”. A namorar desde 2007 com Dax Shepard – talvez conheça a sua cara do elenco de apanhados de “Punk’d” -, Kristen Bell voltará às salas de cinema brevemente com “When in Rome” e “Serious Moonlight”.
A Temporada Que Nunca Existiu
Na esperança de convencer a estação televisiva CTW a renovar a série apesar das fraquíssimas audiências, Rob Thomas, criador de Veronica Mars, elaborou em menos de duas semanas uma pequena amostra do que seria a quarta temporada da série, operando bruscas mudanças no caminho natural da narrativa, adiantando a história cerca de quatro a cinco anos em relação ao espaço temporal em que termina a terceira e última época da série. Num maravilhoso extra que pode ser explorado na edição portuguesa de DVD dessa mesma temporada, vemos agora a protagonista principal como agente acabada de contratar pelo FBI, de fato e saltos altos, mas com a mesma astúcia e matreirice que a caracterizou. Para grande infelicidade de milhares e milhares de fãs – que chegaram a enviar um camião cheio de chocolates Mars para a estação televisiva de modo a convencê-los a renovar a série -, o esforço de toda uma equipa em salvar o que estava em coma, acabou mesmo por não resultar. Porque nem todas as histórias têm um final feliz.
Veronica Mars – O Filme?
Desde o cancelamento da série em 2007, que todos os envolvidos em Veronica Mars, de Rob Thomas a Kristen Bell, expressaram a sua vontade em orquestrar um filme que colocasse um ponto final numa narrativa infelizmente deixada ao sabor da esperança de uma nova temporada, que respondesse a questões tão simples como quem venceu as eleições para o cargo de xerife ou as repercussões das acções de Keith Mars para salvar a filha de um grave problema legal. Sem fundos ou uma audiência que justificasse um projecto de tal calibre, as motivações rapidamente passaram para uma esfera utópica que se reforçava com o passar do tempo. No entanto, o que ninguém esperava era que a série se tornasse um verdadeiro fenómeno no mercado de DVD e fundasse uma legião gigantesca de seguidores que, um pouco por todo o lado, criaram movimentos de apoio e campanhas de assinaturas para a realização de um desfecho que honrasse a memória dos mistérios neo-noirs de Rob Thomas.
E assim foi. Finalmente confiante em obter bons resultados na bilheteira, Joel Silver, produtor executivo de Veronica Mars, confidenciou a Rob Thomas estar agora disposto a produzir e financiar uma adaptação cinematográfica da série. “Tenho tempo para escrever um guião para um filme de Veronica Mars e o Joel Silver telefonou-me a dizer que este é o momento certo para iniciarmos o projecto”, afirmou Thomas a uma revista norte-americana nestas últimas semanas. “O Joel quer fazê-lo, a Kristen quer fazê-lo e eu quero muito fazê-lo também. Para mim, é o meu próximo objectivo. Tenho 70% da história pensada na minha cabeça. Já falei com todo o elenco principal e todos estão interessados em regressar”, concluiu. Uma notícia fantástica contra todas as probabilidades.
Artigo completo com entrevista ao actor Michael Muhney (Xerife Don Lamb) na edição 12 da Take Cinema Magazine.
3 comentários:
que tara por Veronica Mars. uma tara positiva, digamos!
Continua a ser a minha serie preferida de sempre, toda a coleccao de DVDs esta por aqui a espera desse filme.
Tem ainda mais piada quando penso que esta e uma perola ainda descoberta por pouca gente. E achar que ha pessoas que gostam de Heroes e afinas e vao perdendo series como esta... lol
Mas agora deixaste-me confuso. O final deste artigo e mais recente ou mais antigo que a declaracao da semana passada de que o filme seria improvavel?
Eduardo, completamente de acordo. Veronica Mars é uma série fantástica que passou despercebida a muito boa gente. Muita mesmo. E até tivemos a sorte de a ter em edição nacional no mercado de DVDs. O final deste artigo é mais antigo que a notícia recente de que o filme é improvável, infelizmente! Um abraço!
Diana :) Cumprimentos!
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