sexta-feira, dezembro 31, 2021

In Memoriam 2021

quinta-feira, dezembro 30, 2021

Betty White (1922-2021)

quarta-feira, dezembro 29, 2021

The Card Counter (2021)

Paul Schrader é um pessimista por natureza cinéfila. O que torna o seu cinema tão tematicamente previsível quanto de alguma forma irresistível, com os seus protagonistas solitários num percurso autodestrutivo que se transforma numa análise incisiva não só sobre várias questões socioculturais - neste caso relacionadas com a política externa norte-americana e o vício (e os vícios) do jogo e do "american way" - como uma metáfora sobre a vida, o humanismo e o purgatório, os passos dados em falso que comprometem toda uma caminhada. Oscar Isaac com material para provar-se como um dos mais competentes e interessantes actores da actualidade, numa tentativa de redenção filmada de forma exímia por Schrader, mesmo quando este parece não saber bem em que direcção desenrolar a história.

terça-feira, dezembro 28, 2021

The Trashman

segunda-feira, dezembro 27, 2021

Creep (2014) / Creep 2 (2017)

Found footage de terror psicológico, do bom. Impressionante o talento e a mestria de Mark Duplass em transformar cinco páginas de guião com ideias soltas e uma só semana de filmagens num todo que, mesmo construído com base na constante improvisação dos poucos envolvidos, demonstra uma coesão e coerência narrativa e estrutural notável. Inicialmente pensado como comédia negra mas feliz e eficazmente moldado por Patrick Brice para um tom muito mais sério, sentimos em cada cena a dúvida e incerteza que pairava nos actores sobre a acção seguinte. Essa sinceridade ajuda a que seja extremamente difícil resistir a este Duplass, uma das figuras criativas, juntamente com o seu irmão, mais irreverentes do panorama contemporâneo cinematográfico e televisivo. Na sequela, a "youtuber" Desiree Akhavan junta-se a este cocktail a um nível também elevadissímo, num filme que consegue igualar os méritos do primeiro tornando-o ainda mais honesto - o próprio vilão revela a sua identidade e pretensões numa suposta redenção espiritual pré-suicídio. Fico a torcer, muito mesmo, por um regresso a este universo num terceiro capítulo previsto desde o início por Duplass mas que teima em não dar sinais de vida.

domingo, dezembro 26, 2021

Eggers & Skarsgård

sábado, dezembro 25, 2021

En man som heter Ove (2015)

Tão divertido quanto comovente, "Um Homem Chamado Ove" é a adaptação cinematográfica do livro homónimo de sucesso do blogger e escritor sueco Fredrik Backman, uma história de vida inspiradora centrada num velho resmungão patriótico com um coração enorme, tanto no sentido figurado como literal. A bondade e o amor onde menos se espera, numa sólida interpretação do veterano Rolf Lassgård, nem sempre acompanhada no mesmo nível de genialidade e talento pelo elenco secundário - em especial as personagens mais jovens. Ainda assim, é muito difícil resistir a um viúvo que tem que constantemente adiar o seu suicídio para ajudar aqueles que o rodeiam a resolver pequenas e grandes crises nas suas vidas. O impacto que podemos ter na vida dos outros, os raios de luz na escuridão, num filme que reveza na perfeição momentos hilariantes com os encantos das amizades inesperadas. Recomendadíssimo.

sexta-feira, dezembro 24, 2021

Emo Batman

quinta-feira, dezembro 23, 2021

Death to 2021 (2021)

Terminei a análise de "Death to 2020" a desejar que o ano seguinte não desse razões aos seus responsáveis para fazer um "Death to 2021". Não poderia estar mais errado. O mesmo esquema de sátira/paródia, provavelmente mais importante para rever e relembrar daqui a umas décadas do que agora, a quente. Os mesmos méritos que a "prequela" - com o historiador Hugh Grant à cabeça - e os mesmos defeitos: uma visão do mundo que mete os EUA como centro de tudo, mesmo que se trate dos Jogos Olímpicos de Pequim ou daquela série muito violenta asiática com uns capacetes inspirados em comandos de Playstation. Mais do mesmo, é verdade, mas sessenta minutos passam a voar quando se trata de gozar com a estupidez humana.

quarta-feira, dezembro 22, 2021

Don't Look Up (2021)

Sátira apocalíptica bastante competente e incisiva de Adam McKay que revolve em torno da cultura negacionista tão em voga no actual contexto pandémico. Elenco de luxo - que maravilha o momento à Peter Finch de DiCaprio -, uma aura constante com vislumbres de "Dr. Strangelove" e dinâmicas irresistíveis entre várias personagens fazem deste exercício cinematográfico um retrato político e sociocultural tão ridículo - como é suposto ser, por definição do próprio conceito de sátira - quanto pertinente, por mais popularucho e simplificado que esteja para chegar a todos os públicos - ao contrário do complexo "The Big Short" do mesmo realizador sobre a bolha imobiliária de 2008. O multimilionário que é uma espécie de mistura de Musk, Branson e Bezos reunidos num só pateta, a presidente Trumpiana com o seu filho Ivankiano, os "novos" jornalistas e fazedores de opinião, o lucro a todo o custo, o ver para crer, porque a opinião de um qualquer idiota vale tanto como a de um especialista num qualquer assunto. "Não Olhes Para Cima" não acerta em todas as direcções que dispara - os caminhos percorridos pelas personagens de Chalamet e Lawrence, por exemplo, pouco acrescentam -, mas nas que acerta, diverte à brava. Pena que ninguém se tenha lembrado que naquela cena final teria tido mais piada, além da morte "jurássica", terem chegado à conclusão que não tinham levado ninguém jovem o suficiente para garantir a reprodução da espécie.

terça-feira, dezembro 21, 2021

The Pink Panther (1963)

Era para ser um filme em torno da personagem de David Niven, mas o brilho de Sellers enquanto Closeau foi tal que Blake Edwards e os produtores decidiram focar não só este capítulo como toda uma série de sequelas em torno do inspector desastrado. Desastrado por iniciativa de Sellers em concordância com Edwards, já que o guião original descrevia o mesmo apenas como um "correcto, sóbrio e digno oficial da polícia". Claudia Cardinale vestida por Yves Saint-Laurent - pela primeira vez em Hollywood - mas com a voz dobrada por Gale Garnett, porque não sabia falar inglês. Encheu o olho dos espectadores como era pretendido, num exercício requintado de comédia física de Sellers que raramente cai na parvoíce, mesmo estando quase sempre a roçar a mesma. Quem não achou piada nenhuma foi Niven, relegado para segundo plano, recusando após todo o louvor que Sellers recebeu da crítica voltar para as sequelas, percebendo que seria sempre uma personagem secundária. Teve que morder a língua e fazê-lo mais tarde, após a morte de Sellers, doente e a precisar de dinheiro. Curiosamente, e sendo indiscutivelmente um actor portentoso, acabaram por ser os dois maiores flops de bilheteira da saga.

segunda-feira, dezembro 20, 2021

Squid Game (S1/2021)

Talvez tenha sido vítima do seu próprio hype, mas "Squid Game" soube-me a pouco. Começa de forma ousada e inesperada - para jogadores e espectadores - mas vai perdendo impacto com o passar dos nove episódios, com personagens demasiado estereotipadas - como a "louca da casa-de-banho" ou o vilão parvalhão - e uma previsibilidade tremenda na ordem das mortes, com especial destaque para o jogo "mortal" em que todas as personagens-chave ficam na mesma equipa. Os próprios jogos, magnânimos na sua execução técnica, visual e conceptual, acabam por perder brilho ao deixarem de privilegiar o talento em função da sorte, ao mesmo tempo que toda uma narrativa transversal de espionagem e fuga nunca consegue sobressair do contexto violento do "espectáculo" em que está inserido. No fim, para banalizar toda uma aura de crítica e comentário social que envolveu vários dos jogos - como aquele em que marido e mulher percebem que só um deles pode sobreviver -, descobrimos, e atenção ao spoiler, que tudo não passou de uma aposta/parvoíce de um milionário. Muitos méritos que ficaram aqui por elogiar - dos valores de produção à audácia visceral do seu tom -, mas para um grande admirador de "Battle Royale" - e até do subgénero "survival" - como eu, faltou sujidade e imprevisibilidade. Porque não queremos nem lógica nem ordem no inferno.

domingo, dezembro 19, 2021

Pig (2021)

O ritmo não será para todos, muito menos para os que esperavam uma John Wickada com o Nicolas Cage e um porco. Em vez de armas em hotéis, cavalos nas ruas e lápis em bibliotecas, o nosso herói (re)abre a alma e o coração para recuperar o seu animal de estimação numa viagem pelo seu passado ligado ao (sub)mundo dos restaurantes de luxo de Portland. Não por necessidade de sobrevivência - as tão valiosas trufas -, mas por afeição. A subversão inesperada e surpreendente de todo um género, que enfia as nossas expectativas no lixo logo a seguir ao pãozinho com manteiga (cena inicial na casa do bosque) e acaba por nos oferecer todo um arco humanista, qual meditação interessante sobre o luto, a perda e o amor numa refeição chique que prova que Cage é muito mais do que um taberneiro em Hollywood. O estreante Michael Sarnoski deixa-nos em constante tensão na esperança de uma resolução violenta e recompensadora, algo que acaba por nunca acontecer; e é preciso ter tomates para desafiar de tal forma o espectador.

sábado, dezembro 18, 2021

Hardcore Henry (2015)

Que malhão. Filmado praticamente na totalidade com várias GoPro Hero3 colocadas num capacete especialmente criado para o nosso herói, o estilo e a forma deste "Hardcore Henry" não agradará certamente a todos. Mas o filme do russo Ilya Naishuller é muito mais do que um truque de magia engraçado repetido vezes sem conta: há toda uma narrativa bem construída de fundo assente num universo sci-fi muito próprio e, caramba, Sharlto Copley e todo o humor que revolve as suas várias personagens fez-me o dia. Uma granada por dia, não há vilão que resista a tamanha ousadia. Por falar em vilão, que dizer de Akan - pena apenas que não exista qualquer tipo de explicação em torno dos seus poderes telecinéticos - ou do lança-chamas de casaco engraçado. Que dizer da Jennifer Lawrence do Intermarché ou de todas as cenas de acção mirabolantes, entre tanques militares e saltos de parkour, que provocaram tantas lesões e levaram à necessidade de usar quase uma dúzia de actores/duplos no papel de Henry. Financiado através do Indiegogo e comprado por dez milhões de dólares logo após a estreia no Festival de Cinema de Toronto, "Hardcore Henry" merecia mais amor da vossa parte. Mais amor e uma sequela.

sexta-feira, dezembro 17, 2021

Die Welle (2008)

Há aqui todo um empirismo sociológico muito interessante em torno da autocracia/monocracia, uma experiência académica cuja mensagem e propósito se revela cada vez mais pertinente nas sociedades contemporâneas. A execução cinemática e prática da ideia está longe de ser perfeita - o final é exagerado, previsível e desnecessário, acabando por personalizar uma conclusão que deveria manter-se grupal -, mas ficam vários tópicos para discussão posterior: a forma como o ser humano é facilmente manipulado, a sua necessidade de liderança, de regras, de seguir uma linha comum, de se sentir integrado. A forma como os problemas - na época do nazismo, o desemprego e a inflação; nesta situação, a desmotivação, o isolamento na escola, a família que não lhes dá atenção em casa - são o combustível perfeito para o fascismo germinar. E como a sensação de poder pode corromper o mais puro dos idealistas, aqui representado pelo professor que finalmente se vê reconhecido por pares e alunos. Olho vivo amiguinhos, já Chega de problemas.

quinta-feira, dezembro 16, 2021

The Amazing Spider-Man 2 (2014)

Como é que é possível ter uma morte inesperada e chocante de uma personagem-chave ligada ao Homem-Aranha e não conseguir construir e pensar a mesma com qualquer tipo de brilho ou emoção, como um momento-chave que marcaria toda uma nova saga? Marc Webb não é Sam Raimi e não há efeitos especiais ou competência técnica e tecnológica derivada do passar dos anos que substitua o poder da caneta. Jamie Foxx desaproveitado num vilão à Joel Schumacher cujos boxers são da mesma colecção dos calções do Hulk, Andrew Garfield sem carisma para ser mais do que "o" piadolas e o puto Osborn mais emo-enervante da história recente, sempre com a franja diferente a cada mudança de plano. Eu bem que tento fazer as pazes com estas bonecadas todas da Marvel, DC, Sony e companhia; mas não está fácil.

quarta-feira, dezembro 15, 2021

Red Dawn (1984)

Um conceito e uma ideia engraçada - uma terceira Guerra Mundial com os russos a invadirem os EUA - que não teve um guião à altura, esgotando-se cena após cena de acção entre adolescentes rebeldes e comunistas, sem grande brilho ou imaginação, apostando no luto como principal arma contra a imensidão incongruente de nada que para aqui vai. Não há política nem sentido narrativo que sobreviva ao sonho molhado de qualquer conservador, um retrato simplista - para não dizer simplório - do que aconteceria aos Estados Unidos da América se a esquerda radical ligada aos democratas vencesse sobre a direita republicana. Mais preocupados com a propaganda pateta do que com o objectivo de fazer um bom filme, Milius e companhia estatelam-se ao comprido ao não conseguirem criar um universo alternativo realista, caindo nas percepções intelectuais mais chauvinistas e básicas. Mal concebido e mal executado; e nem a Lea Thompson a disparar uma metralhadora salva a coisa.

terça-feira, dezembro 14, 2021

Half Past Dead (2002)

Um dos últimos filmes de Steven Seagal com direito a estreia no grande ecrã, "Half Past Dead" está longe de ser tão mau como a lenda conta. Depois do "Novo México", a "Nova Alcatraz"; e ninguém devia resistir a nada do que envolve Alcatraz quando se trata de cinema. Helicópteros e faróis, combinação letal. Música rap que nunca mais acaba e um sem número de slow-mos nos segundos finais de cada cena, como que um statement qualquer artístico que lançou Don Michael Paul para o lugar que merecia nos anos seguintes: as sequelas do universo "Tremors". Seagal gordo, pouca ou nenhuma química com o espertalhuco do Ja Rule e a reviravolta mais previsível que aquele ilhéu ao largo de São Francisco já viu: sim, Seagal é um infiltrado do FBI. Agora que já separámos o lixo para reciclagem, os grandes trunfos que ficaram esquecidos no tempo: Morris Chestnut é um vilão superior, Il Fuego Tony Plana mete gozo enquanto director prisional meio rufia meio amigalhaço e a Nia Peeples merecia um spinoff daquela sua personagem danada para buffets de balázios, com umbigo à mostra em fato de cabedal e maquilhagem azulada resistente à chuva. Seja feita justiça, "Duro de Matar" enquanto filme de acção de segunda linha, merece muito mais amor.

segunda-feira, dezembro 13, 2021

Venom (2018)

Tão melhor que tanta Marvelzada que sai às paletes todos os anos, sempre a revirar a mesma fórmula, tentando ter piada quando, na verdade, se leva demasiado a sério. E, ainda assim, tão longe do que poderia ter sido. A dinâmica interna entre Eddie e Venom é irresistível, qual herói e anti-herói unidos num só corpo, humor negro leve mas cativante e show de Tom Hardy num registo mais descontraído do que o habitual. Tudo o resto é esquecível, da aborrecida Michelle Williams - quatro nomeações a óscares, zero empenho que não a levantar o cheque - ao pouco convincente Elon Musk diabólico de Riz Ahmed, num superhero buddy movie que banaliza-se como tantos outros na parte do superhero, mas que destaca-se na forma criativa e farrista com que aborda o buddy factor. Contas feitas, e mesmo tendo em conta todo o potencial ultra-violento e visceral desperdiçado de uma personagem como o Venon, possivelmente o melhor filme de Ruben Fleischer desde "Zombieland".

domingo, dezembro 12, 2021

Nas Nalgas do Mandarim - S08E20

sábado, dezembro 11, 2021

tick, tick…BOOM! (2021)

Não consegui fazer click nem com a figura histórica (Jonathan Larson) arrojadamente interpretada por Andrew Garfield nem com o esquema criativo cinemático usado para contar a sua história. Não é bem drama, não é bem musical, não é bem teatro nem cinema. É antes uma espécie de biopic de um musical, onde se reconhece o talento e a dedicação tanto de actores/cantores como de Lin-Manuel Miranda em várias vertentes da sua execução - com destaque para os monólogos e as músicas -, mas em que o todo acaba por se revelar uma confusão enérgica sem foco nem impacto, culpa provavelmente da inexperiência de Miranda enquanto realizador. Personagens estereotipadas e um desfecho que merecia mais do que umas frases em tela. Overrated.

sexta-feira, dezembro 10, 2021

Sonic the Hedgehog (2020)

Jim Carrey com liberdade criativa para voltar aos anos noventa, num buddy movie familiar que faz quase tudo bem no capítulo da diversão e da amizade, mesmo que para tal tenha que ignorar e esquecer-se muitas vezes da lógica em torno da narrativa e do universo que constrói - não é fácil acreditar que a personagem do James Marsden é o fugitivo mais procurado do momento, tal a tranquilidade com que se desloca entre Green Hills e São Francisco, por exemplo. Visualmente um mimo - depois de um primeiro trailer que foi arrasado pelos fãs e que levou, felizmente, a meses de alterações estéticas no ouriço mais famoso do planeta -, humor que funciona tanto para os mais novos como para os mais velhos e, voltemos a Carrey, um autêntico portento de genialidade expressiva e física num vilão que ganha vida e carisma às suas custas. Realização mais do que competente e um anel aberto para uma nova franchise; depois do que vi fazerem com o Pokemon do Deadpool, mais do que comprado.

quinta-feira, dezembro 09, 2021

Dot.com (2007)

A premissa tinha potencial cómico - e até de crítica social e cultural em torno da globalização - mas tanto o resultado final como todo o caminho para lá chegar foi medonho. Acting, direcção de actores, história romântica, contornos políticos e empresariais, tudo de um amadorismo atroz e inesperado. Inesperado é o melhor elogio que se arranja no meio do caos incompetente que para aqui anda, porque reconhece-se o talento de muitos dos envolvidos noutras produções, tanto pré como pós aventura em Águas Altas. Uma entrevista em directo ao primeiro-ministro em véspera de eleições interrompida para dar uma notícia de última hora relacionada com um processo de uma empresa espanhola a uma terrinha do interior, diálogos e interacções que nem num palco de teatro seriam credíveis e um presidente de junta supostamente português que é claramente brasileiro. Mas que tenta passar por português e então parece um atrasito a falar. Vá-se lá perceber porquê.

quarta-feira, dezembro 08, 2021

No Time to Die (2021)

Que belo canto de cisne para Craig enquanto Bond. Que belo canto de cisne, aliás, para todo um arco narrativo, um vilão específico e toda uma era. Há quem diga que "No Time to Die" é um bom filme, mas não é um Bond. Não compreendo. Está cá tudo, mesmo que num tom diferente do que transportou entusiasmo durante décadas e gerações. Pela primeira vez em mais de trinta anos, Moneypenny, Q, Feliz Leiter e M juntos num filme da saga; a Toyota de regresso depois daquele maravilhoso descapotável branco de "You Only Live Twice", no Japão; Blofeld, qual Hannibal Lecter; perseguições de calibre técnico e visual irrepreensível; gadgets; Ana de Armas, com muito pouco sumo mas com portas escancaradas para um possível regresso e Léa Seydoux, talvez num dos papéis femininos mais profundos e importantes desde que Diana Rigg partilhou o ecrã com Lazenby no final dos anos sessenta; cinematografia, sonoplastia, tema principal, tudo nos píncaros com Cary Joji Fukunaga a mostrar a Sam Mendes que se pode ser bonito e sério sem ser chato e enfadonho. Mortes chocantes, M com uma faceta ambivalente refrescante e uma sequência inicial - a no passado, com Safin, provavelmente o único, enquanto personagem mas também actor, que não convence totalmente - do mais cruel e pungente que a saga já mostrou. Folha limpa para começar tudo de novo. Vamos a isso.

terça-feira, dezembro 07, 2021

Infinite (2021)

Não bastava o Mark Wahlberg actor, temos que levar ainda com o Mark Wahlberg narrador? A nossa tão talentosa Joana Ribeiro logo a abrir numa estonteante perseguição automóvel que envolve um Ferrari Testarossa para nos deixar com água na boca. Guardanapo em punho, fica logo pelo caminho, nem mais um pingo de saliva nesta boca seca assim que vejo o Chiwetel Ejiofor gordo e o Wahlberg a tentar não ser parvo. Eu que até tinha o Antoine Fuqua em boa conta - "Training Day" e "The Equalizer" -, desisto rápido de tentar gostar disto quando percebo que existe um ovo capaz de acabar com a vida na Terra. Um ovo. Mais de metade do filme a tentar explicar o conceito de renascimentos, ressureições e almas eternas à personagem do Mark - e provavelmente ao Mark -, sem sucesso. Nem ele, nem nós por arrastamento, conseguimos fazer sentido no meio de tanta cavadela lógica. Como um laboratório ultra-moderno com tecnologias nunca antes vistas mas que não tinha a porra de um desfibrilador para reanimar alguém que já se sabia que ia precisar de ser reanimado. Nada como uns bons murros no peito musculado do Mark para lhe fazer bem ao ego. Rios de dinheiro metidos nisto - trinta Aston Martins foram parar à sucata - para uma bosta seca final de proporções épicas. Motas a aterrar em aviões em pleno vôo, super-heróis inesperados, quedas livres de milhares de metros no oceano com nota artística olímpica e, caraças, já vos falei do ovo apocalíptico? Não consigo parar de rir.

segunda-feira, dezembro 06, 2021

I onde dager (2021)

O norueguês Tommy Wirkola amadureceu, para o melhor e para o pior. Não existe aqui a loucura desmedida nem os zombies apocalípticos dos seus dois "Dead Snow" - a faceta nazi sobreviveu, no entanto -, mas o humor negro e a violência visual mostra-se a um nível muito mais refinado e apurado. Elenco fenomenalmente competente em quase todos os tons que lhes são requisitados, do drama ao humor, da acção ao mistério, talvez com a excepção de Aksel Hennie, que sofre na sombra da estrondosa Noomi Rapace. Reviravolta atrás de reviravolta, de drama conjugal a filme de invasão caseira, dos diálogos divertidos ao gore sangrento, eis uma proposta refrescante no catálogo cada vez mais cansado e formulaico da Netflix.

domingo, dezembro 05, 2021

Pourris gâtés (2021)

Como se não chegassem por si só as comédias francesas, temos agora as comédias francesas da Netflix. Pior: comédias francesas da Netflix que são remakes de sucessos de outros países, neste caso do mexicano "Nosotros los nobles". Jovens adultos ricalhaços franceses com vida inesperada de pobre, numa lição de vida do pai multimilionário que subiu a pulso e não se revê nos comportamentos snobs e idiotas dos descendentes. Dois ou três momentos de humor bem conseguidos não compensam a falta de coração e toda a superficialidade que rodeia a "humanização" dos "Mimadinhos", numa história que tem vergonha de arriscar uma lágrima ou de disparar uma palavra mais profunda. Ainda assim, que bom rever Gérard Jugnot e descobrir Camille Lou.

sábado, dezembro 04, 2021

Banking on Bitcoin (2016)

Apesar de já levar com meia década em cima, "Banking on Bitcoin" continua a ser o documentário mais popular em torno do universo das criptomoedas. A génese da Bitcoin, o seu conceito e potencial para transformar os mercados financeiros, as figuras chave da tecnologia - incluindo o misterioso Satoshi Nakamoto, que ninguém tem bem a certeza quem é, qual Keyser Soze do universo cripto -, a ideologia, a utopia, o combate mascarado ao capitalismo corrente e os milhões em jogo para inúmeros investidores. Não vão encontrar aqui conselhos nem estratégias para entrar em campo; mas ficam bem documentados de todo o percurso que levou a Bitcoin dos campeonatos distritais à divisão principal. E a Liga dos Campeões está aí ao virar da esquina.

sexta-feira, dezembro 03, 2021

The Ninth Gate (1999)

Que salganhada mitológica e narrativa Polanski. Mil e uma teorias macabras de fãs - principalmente em torno da rapariga misteriosa e da cena final - destroçadas pelos comentários em DVD do realizador que ofereceu uma resolução simplista para vários dos enigmas simbólicos do filme. Premissa interessante construída através de um livro fictício, elenco secundário de qualidade - Langella, Olin e Seigner -, dois ou três bons momentos cinemáticos - com especial destaque, por motivos óbvios, para as cenas filmadas em Sintra - e... pouco mais. Falta tensão, falta noção e realismo na ligação entre as personagens e os acontecimentos - a forma como Corso e a rapariga se relacionam de forma tão próxima sem ele fazer a mais pequena ideia sobre a sua identidade ou intenções é quase cómica - e a sensação de que ou Depp não soube calçar as botas da sua personagem ou que Polanski deu-lhe o par com o número errado. E para correr uma corrida de obstáculos ocultos como esta, é preciso estar bem calçado. Como n'A Semente do Diabo, feito trinta anos anos pelo mesmo sapateiro.

quinta-feira, dezembro 02, 2021

M*A*S*H (1970)

A loucura da guerra e como sobreviver à mesma com sentido de humor. Humor ora pateta, ora negro, ora misógino, ora quase imperceptível no meio de tanto atropelo derivado do improviso que Robert Altman incentivou - e que levou a que o guionista, curiosamente o único que acabou premiado nos Óscares, saltasse fora a meio das gravações -, humor que deu as mãos a um realismo visual das consequências da guerra quase inédito na altura no grande ecrã: o sangue a jorrar de um ferido enquanto o cirurgião pede à enfermeira que lhe coçe o nariz. É o descontrolo total, o rir-se na cara das convenções da Hollywood de então - todo o processo de pós-produção e as tentativas dos produtores em censurar e mudar a visão de Altman dariam um documentário interessantíssimo -, num registo nem sempre equilibrado, às vezes até mesmo absurdo que, no entanto, não teve medo de enfrentar questões em torno da moralidade do envolvimento dos EUA no Vietname, aqui disfarçado de Coreia. Tantas estrelas de hoje, então incertezas, num low budget que deu origem a uma das séries de maior sucesso e longevidade da história da televisão norte-americana; uma que aprimorou tudo o que aqui não convenceu.

quarta-feira, dezembro 01, 2021

Nine Perfect Strangers (S1/2021)

Todo o pedigree do mundo para ser uma série dos diabos: adaptação de uma obra literária de sucesso de Liane Moriarty ("Big Little Lies"), autoria do conceituado David E. Kelley, realização integral do promissor Jonathan Levine e aquele que foi, muito provavelmente, o elenco mais completo e resplandecente do ano: Nicole Kidman, Melissa McCarthy, Michael Shannon, Luke Evans, Samara Weaving, Regina Hall, Bobby Cannavale, entre outros nomes menos conhecidos do grande público (Grace Van Patten ou Tiffany Boone) mas com talento suficiente para não destoar da trupe de pesos pesados. E, no entanto, por cada episódio dos oito finais que passava, por cada mistério que começava a mostrar as suas pontas, aumentava a sensação do perfeito desastre de expectativas defraudadas que estava a ser construído. O grande plano da fundadora da Tranquillum não cola de tão patético que se revela, as vibes de uma espécie de culto dissipam-se no meio de tanta droga alucinogénica e, levando-se tão a sério na suas pretensões extra-sensoriais e divinas, nem a faceta de crítica satírica aos centros de bem-estar e de terapia holística funciona no meio de todo o vácuo conceptual que é criado em torno de um conjunto de interpretações de altíssimo calibre. Valeu a pena por estes, mas caramba, que desperdício.