O livro de Alice Sebold, autora que se deu a conhecer ao mundo com “Lucky”, um relato autobiográfico da sua própria violação e que em muito explica a narrativa de Visto do Céu, foi considerado na altura do seu lançamento um romance fantástico e surpreendente sobre a vida e a morte, o perdão e a vingança. A adaptação cinematográfica de Peter Jackson, essa, é a estocada final em quem duvidava que existem palavras que não devem ser, de forma alguma, transpostas para imagens. Porque nem um realizador do calibre do neozelandês conseguiu resolver o problema cinematográfico eterno de tornar real algo tão subjectivo e imaginativo como o Céu ou o purgatório. O resultado técnico final acaba por ser algo ridículo, sendo que a narrativa em si perde todo o sentido prático e existencialista do livro. No final, tudo leva-me a acreditar que nem Jackson fazia ideia do que estava a tentar transmitir.
A comparação com o livro continua inevitável. Alice Sebold analisava uma América profunda, dando respostas claras – pelo menos na sua cabeça - sobre o que se passava depois da morte, sem cair em sensacionalismos urbanos, através de uma escrita cativante. O filme de Jackson, por sua vez, transforma a filosofia fantasista de Sebold numa história de gato e do rato, em que o objectivo único parece ser o de apanhar o brutal violador até ao final da fita, pavoneando aqui e ali alguns momentos confusos sobre a permanência de Susie Salmon (a promissora Saoirse Ronan) num limbo celeste. Ou seja, uma parábola que meditava sobre a vida após a morte e o purgatório, deixando a vingança para segundo plano, foi transformada banalmente no inverso, o que acabou por transformar "The Lovely Bones" num simples thriller adolescente.
Em suma, Jackson e a sua equipa de guionistas tomaram várias decisões catastróficas que arruinaram todo o potencial de uma história única. Nem o casting escapa, com várias interpretações triviais como as de Wahlberg, Weisz ou Imperioli, que não nos conseguem transportar para a mágoa, angústia e inquietação da violação e da morte de Susie. Felizmente, Stanley Tucci agarra de forma titânica a oportunidade de interpretar um vilão brilhante na sua carreira, conseguindo inclusive uma nomeação da Academia norte-americana para melhor actor secundário, onde perdeu – justamente, diga-se de passagem – para Christoph Waltz, o genial Coronel Hans Landa de Quentin Tarantino. Numa frase, "Visto do Céu" tinha tudo para ser um grande filme... e é exactamente isso que o torna numa das mais frustrantes desilusões do ano.
1 comentário:
Como li algures: "é o melhor pior filme de sempre".
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