terça-feira, junho 30, 2009

Terminator Salvation (2009)

Quando no início dos anos oitenta o desconhecido James Cameron começou a trabalhar o guião de “The Terminator”, o entusiasmo dos produtores e do público era quase nulo. O seu filme de estreia, “Piranha II: Flying Killers”, assim o condenava à desconfiança geral e a um atraso de vários anos até finalmente conseguir lançar a fita, em 1984. Um quarto de século depois, a apesar do mito de culto criado ao redor do Dia do Julgamento, de John Connor e dos exterminadores da Skynet, o cenário não foi muito diferente quando a notícia saiu de que seria McG a continuar uma saga que, já em 2003, tinha levado um duro golpe dada a diferença abismal de talento e intenções entre Cameron e Jonathan Mostow. Com uma nova contrapartida: McG já não era uma dúvida mas uma certeza que tinha provado por variadas vezes ser um realizador que privilegiava o estilo e acção sobre a narrativa e a profundidade dramática e estrutural. O receio de que um marco do cinema de ficção científica fosse banalizado, uma vez mais, e colocado ao nível de uma qualquer sequela de “Charlie’s Angels”, apoderou gerações de cinéfilos.

Agora que “Terminator Salvation” chegou até nós, é justo dizer que McG superou-se a si próprio, orquestrando o melhor filme da sua ainda curta carreira. Verdade seja dita, tal não era um desafio difícil de alcançar. E, infelizmente, McG fê-lo sem mudar de personalidade artística e confirmou que precisa de usar a sua “muleta” de acção desenfreada para disfarçar incapacidades óbvias de construção narrativa. O que lhe vale é que foi, desta vez, uma “muleta” banhada a ouro, mais do que suficiente para um coxo ganhar uma corrida contra um perneta – entenda-se terceiro capítulo – e dar asas a uma possível nova trilogia, desta vez focada num espaço temporal posterior ao Dia do Julgamento. Venha o que vier, temos que perceber de uma vez por todas que acabaram-se os cem metros olímpicos de Cameron.

Num breve enquadramento, “Exterminador Implacável: A Salvação” tem lugar no ano de 2018, numa pós-apocalíptica Califórnia. A guerra entre humanos e as máquinas pelo domínio total do planeta é uma realidade e John Connor começa a marcar posição enquanto uma das figuras de proa do movimento de resistência humana. Kyle Reese, o seu “futuro” pai, é apanhado e tornado prisioneiro da Skynet, o que obriga Connor a mudar o plano de bombardear a sede das máquinas para um esquema suicida com Marcus Wright, um estranho cuja falta de memória detém o segredo que trilhará o destino da humanidade.

Se a premissa é mais do que aceitável, a sua concretização rapidamente se transforma num guião repleto de falhas e incoerências narrativas. Entre elas, destaque para as personagens, das novas às repetentes, serem muito pouco exploradas – o exemplo mais dramático é o da namorada de Connor, interpretada por Bryce Dallas Howard, cuja gravidez não é sequer referida, apesar de notória, e o seu papel na vida do herói ser resumido a um par de beijos e abraços – ou para o facto de as máquinas da Skynet conseguirem detectar uma música de rádio a quilómetros mas não descobrirem a resistência quando estes lançam um bombardeamento feroz a uma das personagens. Há muitas outras falhas chocantes – entre elas, Reese estar no topo da lista “a exterminar”, mas quando é capturado ser enclausurado ao contrário de tantos outros, rapidamente aniquilados – que conduzem a uma conclusão óbvia: McG perdeu o fio à meada no fantástico espectáculo pirotécnico que criou.

Ao elenco, pelo contrário, poucas lacunas podem ser apontadas. Christian Bale cumpre os requisitos mínimos, ajudando a construir com a sua voz cerrada e interpretação metódica o ambiente enevoado e cinzento da obra, sem dúvida um dos maiores feitos artísticos de McG em “Exterminador Implacável: A Salvação”. O que falta a John Connor, enquanto líder carismático, deve-se à fraca caracterização concedida pelos guionistas – basta dizer que são os mesmos de “Catwoman” e não ao talento inquestionável de Bale. O joven Anton Yelchin conquista a audiência com a sua simplicidade e honestidade dramática, cabendo no entanto a Sam Worthington o melhor papel e, consequentemente, a melhor interpretação da obra. Destinado ao estrelato, a sua presença cativante na tela promete um futuro auspicioso em Hollywood. Moon Bloodgood confirma-se enquanto uma das mais belas e exóticas actrizes da actualidade – mas fica por aí, já que a sua personagem pouco mais necessitou do que isso – e Michael Ironside é completamente arrasado por clichés arrogantes e patéticos.

Independentemente dos paradoxos resultantes da falta de linearidade temporal das várias histórias que se cruzaram ao longo dos quatro capítulos da saga, o problema real de “Terminator Salvation” foi o argumento ter sido entregue a uma equipa de guionistas que não o merecia. A construção narrativa acabou por meter água por todos os lados e os diálogos – à excepção do discurso de rádio de Connor perto do final – poderiam ter sido escritos por uma criança do ensino básico, tão vácuos e inconsequentes que provaram ser. McG fez o que podia – e da forma que sabia - para salvar o filme da mediocridade, entregando ao público um pacote de acção formidável e um ambiente escuro, tal como os sonhos de Sarah Connor um dia preconizaram. Resta esperar que um próximo episódio, quase certo dado o final aberto da fita, saiba aproveitar todas as potencialidades de uma história e de um universo ficcional único.

8 comentários:

Nuno Pereira disse...

A tua analise ao filme esta correctissima. O Argumento tinha muitas potencialidades que não foram devidamente explorados...

Quanto ao McG, acho que as cenas de acção do filme também são muito copiadas de outros filmes, e falta-lhes aquela grande cena de acção que gostamos de comentar.... o T3 teve essa cena!!!

No entanto e mesmo com todas essas falhas que comentaste acho que o filme cumpre bem como filme de epoca (blockbuster).

Nuno Pereira disse...

Mas o culpado de tudo é o James Cameron, que habituou mal o pessoal....

cumpts.

Nasp

Paulo Ferreira disse...

Crítica correctíssima por parte do Miguel Reis, focando claramente os dois grandes pecados do filme: um argumento fraquíssimo (a "falha" do (não) extermínio de Reese é inacreditável) e a primazia dada à piroctenia em detrimento da substância.
Gostava por último de referir que este "Terminator" fica também para a posteridade como o primeiro da saga que não contém uma ÚNICA cena de gore, que era uma das imagens de marca da série (caramba, até o do Mostow cumpria essa "regra").

Cumprimentos a todos.

lmlas disse...

Concordo... Nada a acrescentar... O filme acaba por cumprir!

Um daqueles exemplos em que o trailer ultrapassa de longe o filme...

abidos disse...

Subscrevo...

Mesmo as cenas de acção merecem reparos, pois fiquei com a ideia que houve 'cortes', terei que esperar pela versão de DVD...!!!

brain-mixer disse...

Nasp, quando dizes "falta-lhes aquela grande cena de acção que gostamos de comentar", eu devo referir (pessoalmente) que a cena do ataque à bomba de gasolina com o Transforminator e as motas, é de longe uma das melhores cenas de acção do ano...
De resto boa análise, Knox ;)

Nuno Pereira disse...

@brain-mixer, são gostos!

Pessoalmente não acho nada de especial essa cena inicial... o Mad Max tem algumas cenas dessas..

disse...

não dava nada pelos filmes anteriores... (talvez porque o primeiro filme estreou no ano que nasci).
Mas quando saiu este filme, tinha acabdo de passar na tv o exterminador 3... e fiquei curiosa e fui ver.
Agora percebi os 4 filmes.
Adorei o filme.
Venha o próximo!

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...