7 de Agosto de 1974. Depois de uma cansativa madrugada a preparar aquele que viria a ser considerado mais tarde o “crime artístico do século”, um exausto Philippe Petit prepara-se para atravessar um arame preso entre os topos das duas torres gémeas do World Trade Center, em plena Nova Iorque, sem qualquer protecção ou rede de segurança instalada. “Man on Wire”, obra do britânico James Marsh premiada com o Óscar de Melhor Documentário, narra a história de uma ideia que nasceu numa sala de espera de um dentista e a preparação de um acto ilegal de imprudência humana, que colocava em causa não só a vida do funâmbulo francês, mas os destinos de todos aqueles que o ajudavam.
“Homem no Arame” é um documentário sobre uma epopeia fantástica e impossível de coragem, perseverança e determinação humana. Numa montagem harmoniosa entre imagens de arquivo, entrevistas actuais e dramatizações de época e uma sonoplastia cuidada ao cargo dos temas escolhidos pelo conceituado Michael Nyman, a nível técnico poucas ou nenhumas lacunas podem ser atribuídas a James Marsh e à sua equipa. O primeiro desafio colocado a Marsh terá sido mesmo o de transformar a razão de ser de “Man on Wire” na obrigatória hora e meia de fita. Inteligentemente, articulando as travessias entre os sinos de Notre Dame e as torres da Ponte de Sidney Harbout na primeira meia hora, Marsh constrói uma base de fundo que permite ultrapassar essa barreira, sem monopolizar o interesse da obra ou atormentar a paciência do espectador com uma única vertente narrativa.
Mas há em “Homem no Arame” uma visão demasiado unilateral de glorificação do feito. Os custos e as dificuldades são exacerbadas ao máximo, enquanto que as comodidades do contexto socioeconómico de Petit são colocadas de parte. Durante hora e meia conhecemos o melhor de um homem fantástico, para depois percebermos que a fama o levou para o lado negro da força. Quando pensamos que vamos ver esse lado explorado, um simples “porque sim” de um dos seus melhores amigos e algumas lágrimas da soluçante ex-namorada encerram esse novo capítulo da vida de Philippe. Terá sido um caso amoroso secreto suficiente para quebrar laços tão fortes com todos aqueles que o ajudaram? Não me parece. Seria mesmo Petit um simples funâmbulo? Se sim, como arranjava dinheiro para tantas viagens intercontinentais de preparação do “golpe”, bem como para todos os materiais envolvidos? Ao entusiasta mais atento, dificilmente passarão em claro estas dúvidas. E é essa concentração na beatificação do herói, enquanto que o vilão é colocado de parte, que faz com que “Man on Wire” pareça um projecto algo adulterado. E é pena que assim o seja.
3 comentários:
Parece muito interessante
Eu dava-lhe mais uma estrelinha...
Olá,
Mto bom esse seu texto sobre o "Man on wire", concordo plenamente.
Uma amiga tinha me falado muito bem desse documentário, mas tive a mesma impressão de unilateralidade do feito de Philippe Petit.
E achei a sua análise muito precisa, muitas questões ficam obscuras no final do documentário.
Parabéns pelo texto.
Saudações brasileiras.
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