Baseado num caso verídico que chocou os Estados Unidos da América em 2004, “Compliance” retrata fielmente a história de uma funcionária de um restaurante de fast food que foi humilhada, espancada e obrigada a cometer actos sexuais contra a sua vontade por ordem de uma voz autoritária ao telefone que se identificava perante a gerente do estabelecimento como um agente policial com uma queixa de roubo ao balcão em mãos. Com ameaças constantes de encarceramento, investigações policiais a familiares e muitas outras balelas dominadoras previamente estudadas, o desconhecido ao telefone consegue fazer com que todos os limites do bom senso sejam ultrapassados, aproveitando o respeito da sociedade perante forças da autoridade e consequente medo de represálias em caso de irreverência.
Estreado recentemente em território nacional graças à Vendetta Filmes, distribuidora que em boa hora apareceu e recuperou para as salas de cinema lusitanas alguns produtos independentes de qualidade que caso contrário estariam condenados ao anonimato, “Obediência” revela-se um docudrama controverso – a realidade retratada é tão cruel e surreal que levou a que vários espectadores e jornalistas abandonassem a meio a première do filme no Festival de Sundance – filmado de forma magnânima pelo desconhecido Craig Zobel (“Great World of Sound”), que entre a frieza ácida das fragilidades humanas reflectidas em personagens tão débeis de espírito quanto complacentes com um comportamento em sociedade tido como exemplar – o respeito incondicional às autoridades -, e simbolismos vários que permitiram evitar o choque visual de momentos sufocantes – o enfoque numa palhinha e num balde de água suja, por exemplo, numa cena de sexo oral forçada -, consegue providenciar alguma subtileza artística a uma narrativa hedionda sobre uma sociedade alienada de valores básicos – o incidente retratado foi apenas um dos setenta similares que ocorreram em mais de trinta estados norte-americanos.
No elenco, destaque justo para a secundária Ann Dowd enquanto gerente do restaurante, que lhe valeu um galardão da National Board of Review e que, providenciam os vídeos disponíveis no Youtube sobre o caso real, assentou-lhe que nem uma luva, bem como para Dreama Walker, num papel altamente emocional e fisicamente desafiante, ao qual a jovem actriz regular em séries como “The Good Wife” ou “Apartment 23” respondeu com uma robustez e susceptibilidade impressionantes. No fim, fica o sentimento de que um documentário sobre o assunto poderia ter sido melhor recebido, mas seria sempre o drama de Zobel o melhor veículo para um McMenu de emoções. E quem quer um Happy Meal quando pode levar uma dose super de batatas?
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