Roménia, 1985. O regime comunista de Nicolae Ceaușescu dura há duas décadas. O povo romeno vive isolado culturalmente, privado da sua liberdade de expressão, controlado em todos os seus movimentos pela polícia secreta. A televisão nacional só passa propaganda comunista e socialista e a venda de leitores VHS está proibida. É neste contexto que vão nascer duas lendas clandestinas do povo romeno: Irina Nistor, a voz mais conhecida da Roménia, tendo dobrado sozinha todas as personagens de cerca de três mil filmes norte-americanos, e Teodor Zamfir, o homem que clandestinamente trouxe milhares de cassetes e leitores VHS para Bucareste, que contratou Irina e deu-lhe, na sua própria casa, todas as condições para executar as dobragens. Ela era a voz da liberdade e da esperança; ele, o responsável por todo um movimento
underground que lhe transformou num dos homens mais ricos - chegou a ganhar, por dia, o equivalente ao preço médio de uma casa - e influentes da Roménia, depois de ter manipulado e subornado com cassetes gratuitas praticamente quase todas as forças de estado, da polícia secreta ao próprio filho de Ceausescu, que queriam desfrutar sigilosamente do cinema ocidental e que temiam que Zamfir os denunciasse caso fosse apanhado. Um belíssimo documentário, magnificamente estruturado do início ao fim, com direito a twist e tudo em relação a um dos trabalhadores de Zamfir e, obviamente, com um dos melhores títulos de sempre. Não só porque tem um sainete desgraçado, mas porque encaixa na perfeição com o desenrolar da obra da jovem Ilinca Calugareanu, que mostra como este mercado ilegal de cassetes e as consequentes noitadas clandestinas de cinema em casa dos amigos foram a primeira janela de um povo para um mundo até então desconhecido, repleto de carros modernos, casas majestosas e lojas cheias de comida. Didáctico a nível político e histórico, delicioso na forma como demonstra o poder do cinema.
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