Depois de revigorar recentemente o género de terror com o portentoso “Saw – Enigma Mortal”, o jovem realizador James Wan constrói em “Sentença de Morte” um não mais do que interessante thriller urbano de série B. Tudo começa com um genérico construído a partir de gravações caseiras, que mostram vários momentos marcantes de uma família unida e feliz. Elaborada esta introdução, Wan coloca nas suas mãos a capacidade de saltar imediatamente para o primeiro ponto de viragem – que normalmente só aparece perto do trigésimo minuto -, momento em que Nick Hume assiste ao assassinato bárbaro e demente do seu primogénito numa estação de serviço, por mero apetite voraz de um gangue local. Com a sua vida virada do avesso, Hume é ainda informado algum tempo depois que o responsável pelo crime apenas foi condenado a uma pena de prisão de meia dúzia de anos. E é nesse momento que decide retirar todas as acusações e fazer justiça pelas suas próprias mãos.
“Death Sentence” é a prosopopeia cinematográfica de um maratonista que arranca em grande velocidade, ganha destaque inicial na frente da corrida, mas que acaba por não ter pedalada para manter o ritmo e chegar à meta junto dos melhores. Baseado num dos livros de Brian Garfield, o mesmo autor da obra literária que inspirou “O Vingador da Noite”, de 1974 - e que imortalizou Charles Bronson -, o filme transforma-se aos poucos numa banda desenhada negra e distante sobre a vingança como obsessão e estilo de vida. Seguindo uma relação de “violência que gera violência”, Kevin Bacon acaba por se tornar na própria escumalha que persegue, ao contrário de Bronson, que nunca abandonava moralmente o flanco dos bons da fita. E apesar de essa ter sido uma batata quente com a qual Wan não soube ainda lidar – já dizia Clint Eastwood numa das suas obras mais notáveis, “um homem tem que saber quais são as suas limitações” -, foi esse mesmo aspecto que permitiu que a grande lição a retirar do filme não tombasse para nenhum dos lados. Não há final feliz – nem sequer um final de jeito, imagine-se – nem vitória dos heróis; apenas a conclusão de que a vingança fria e crua acaba por resultar num círculo vicioso de raiva e ódio, com proventos fúteis, senão mesmo perversos.
Estamos então perante uma fita desequilibrada, onde o genial – por exemplo, aquela perseguição insigne a pé, num parque de estacionamento de vários pisos, construída e editada posteriormente de forma exímia – oscila muitas vezes com o banal – diálogos pouco trabalhados e aquele final medonhamente poético, tão grotesco como decepcionante. No entanto, subsiste a valentia enquanto entretenimento dramático desfocado de um julgamento moral dogmático. E só assim, sem grandes pretensões ou exigências, é que “Sentença de Morte” consegue ser apreciado. Caso contrário, terá simplesmente que se contentar com um par de cenas memoráveis, uma homenagem visível a “Taxi Driver” e um cameo ou outro delicioso de John Goodman, um actor constantemente esquecido por quem de direito.
3 comentários:
É verdade! Vi-o há bastante tempo, mas lembro-me de ter ficado um pouco desiludido com a história no final...
Acho que na cena da capela no fim poderiam ter aproveitado um pensamento de George Orwell (passo a citar): "Revenge is an act which you want to commit when you are powerless and because you are powerless: as soon as the sense of impotence is removed, the desire evaporates also." [não digo mais porque nao quero ser spoiler, mas quem viu acho que percebe]
Não achei um filme muito mau, mas estava a espera de mais...
um grande abraço Knox!
Eu gostei do filme.
Admito que não seja uma "obra prima", mas sendo um fã dos revenge movies que populavam os cinemas e clubes de video nos 80s, este acaba por ser um bom retorno a este estilo de género.
Quanto ao fim... achei que o efeito pretendido era mesmo esse.
Bom fim de semana prolongado - e aproveitem para rever o Blade Runner no grande ecrã! :)
Definitivamente também estava à espera de mais, apesar do filme ter momentos isolados muito muito bons - a perseguição no parque, por exemplo. Mas Wan tem futuro. Vamos esperar por o que aí vem. Um grande abraço Dutch!
Carlos, eu percebo a mensagem do final, mas julgo que a execução da cena final deixou muito a desejar. Poderiam ter feito passado a mesma ideia com moldes bem mais imaginativos. Quanto ao Blade Runner, já o fui ver esta semana. Por vezes, nem se dá conta que é um filme com 30 anos. É notável! Um abraço!
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