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A vida desportiva de Cassius Clay - que após se dedicar ao islamismo, alterou o seu nome para Muhammad Ali, principalmente porque acreditava que o seu nome tinha origem na escravatura dos seus antepassados -, considerado por muitos como o maior lutador da história do boxe, o profeta desbocado que não protegia a cara nos ringues, vista na perspectiva de vários familiares, fãs e amigos próximos. O pugilista que voava como uma borboleta e picava como uma abelha, revisto em quase duas horas de documentário que, ainda assim, deixa a sensação de que muito mais ficou por mostrar. Numa altura de grande segregação racial, Ali foi figura de proa na revolução social e cultural que modificou os EUA nos anos sessenta e setenta, muito devido ao seu estilo sem papas na língua nem modéstia na sua auto-apreciação. Suspenso dos ringues, no pico da sua carreira, durante quatro longos anos por ter-se recusado a participar na Guerra do Vietname, criticando-a publicamente e liderando a revolta nas ruas, Ali disse um dia que "
o maior título desportivo de nada vale se um homem não puder ser livre"; e isso tornou-o uma lenda não na história do desporto, mas sim da humanidade. Uma que, imperceptivelmente, é tratada como se já estivesse morta, mesmo neste documentário que lhe celebra a vida, referindo-se toda a gente a Ali no passado. E ele, por pior que esteja devido à doença de Parkinson que lhe foi diagnosticada ainda nos anos oitenta, não merece tal desprezo. Porque um único plano na actualidade, mesmo que em silêncio profundo, teria valido ouro.