segunda-feira, maio 26, 2008

[Rec] (2007)

Numa noite como tantas outras, uma equipa de reportagem de uma estação espanhola de televisão decide acompanhar a vida de um quartel de bombeiros local. Durante a madrugada – que estava a ser demasiado calma e apática para o gosto da jornalista de serviço - eis que surge finalmente uma chamada de emergência. Apesar de ser, segundo o telefonema, apenas uma senhora de idade presa no seu apartamento, sempre era algo para mostrar mais tarde. Mal sabiam eles que acabariam por ser encarcerados no prédio pelas autoridades, que isolam o edifício de forma célere e tresloucada. “Mas que raio se passa aqui?”, pergunta, a certa altura, o operador de imagem. “Não faço ideia! Mas não desligues essa camerâ, aconteça o que acontecer, ouviste?”, replica a jornalista. E é esta mesma a perspectiva que nos é dada: imagens aparentemente não editadas, com uma tremedeira intolerável, num estilo semelhante ao recente “Nome de Código: Cloverfield” ou ao semi-pioneiro do modo artístico representado, “O Projecto Blair Witch”.

[Rec]” foi o heróico vencedor da última edição do Fantasporto ao arrecadar o Grande Prémio de Melhor Filme, batendo o favorito à partida “El Orfanato” - outra produção espanhola - na corrida final pelo galardão. Apesar da sua curta duração – cerca de setenta e cinco minutos limpos (sem contabilizar os créditos finais, portanto) -, “[Rec]” é um mockumentário de zombies eficaz e compacto, que consegue criar, de modo incessante e de forma equilibrada um nível de tensão que se torna mais angustiante a cada minuto que passa e que culmina numa cuidada cena dramática final, que oferece ao espectador o que havia sido preterido até então: o domínio da paranóia de sugestão ao invés do medo violento e carnal que tomou, a certa altura, a fita por completo. E deste modo, Jaume Balagueró – responsável pelos levianos “Darkness” e “Fragile” - e Paco Plaza conseguem ofuscar algumas debilidades estruturais que colocavam “[Rec]” ao nível de tantas outras obras modernas de terror.

Sem grande preocupação em levar as personagens a uma plataforma mais íntima, a dupla espanhola não cai por isso mesmo no erro de recorrer a uma ligação excessivamente sentimental entre as personagens principais para dar qualquer tipo de profundidade emocional que seria desnecessária à trama. Com um elenco de cariz realista comandado pela berrante Manuela Velasco – que conquistou o Goya de Melhor Actriz com este papel -, resta regozijar o formidável esforço colocado ao serviço da sonoplastia da fita, bem como o muitas vezes desprezado trabalho de caracterização estética das monstruosidades perversas de “[Rec]”. Com remake norte-americano já com estreia marcada – e pelo que o trailer dá a entender, muito fiel à produção espanhola -, “[Rec]” é a prova de que o cinema espanhol está a ganhar notoriedade (merecida) em várias frentes, ficando cada vez menos dependente do rótulo “Pedro Almodóvar”.

9 comentários:

Anónimo disse...

Mais uma boa critica, para um bom filme... sem duvida que o cinema Espanhol esta conquistando audiençias aqui em Portugal e por esse mundo fora.

cumpts.

joaorsilva disse...

Acabei agora mesmo de ver este filme. Adorei!

Excelente critica Knox ;)

DAGC disse...

Boa critica, concordo 100% com ela.

Foi uma boa surpresa, logo eu que não sou muito dado a filmes de terror. Mas este filme surpreendeu-me e muito.

É um filme curto, mas que funciona bem assim, a emoção/histeria do filme vai crescendo à medida que os minutos passam. E é essa constante que faz com que o espectador se mantenha num estado de atenção, e preso, à história de uma maneira tal que faz com que o filme funcione onde muitos outros já falharam.

Ricardo-eu disse...

Eu não gosto de ser chato, mas estas coisas de discordar ás vezes acontecem, e eu não consigo concordar na totalidade, mesmo que o filme meta de facto medo, que mete, e me tenha atormentado no último mês, não quer dizer que o filme não seja académico. Em que é fácil prever o desenrolar da história. Mesmo sendo interessante, eu não acho que seja mais do que isso (interessante) e para além disso este género já foi feito e refeito.
Pior que isso é o remake americano que já está a ser feito (estreai lá para Outubro nos EUA), vejam o trailer e até vão ter vontade de vomitar, porque o filme é a cópia plano a plano deste [REC] que mesmo que dizendo a verdade não é mau de todo. Chama-se Quarentine e o site da apple tem o trailer.

Carlos M. Reis disse...

Nasp, pricipalmente aqui por Portugal, já que lá por fora Almodovar já havia conquistado grandes nichos. Enquanto provar - como tem provado - que merece... ;) Cumprimentos.

Edge, obrigado ;) Um abraço!

DAGC, eu também confesso que não sou muito adepto de filmes de terror - apesar de ver muitos, porcausa da minha namorada. Mas Rec é diferente e não se limita ao susto fácil. No género, gosto mais de filmes sugestivos e não de impacto. Um grande abraço!

Ricardo, qual chato qual quê ;) Os melhores debates e trocas de ideias só ocorrem quando alguém discorda ;) Quanto ao remake, o trailer parece mesmo ser uma cópia chapada. Mudam as caras só ;| Um abraço!

Anónimo disse...

Também não costumo gostar deste tipo de filmes(zombies), mas gostei do REC, o efeito claustrofobico foi conseguido, o que valoriza muito a experiência. Com a 'cereja em cima do bolo', a aparecer no final, com a ligação Portuguesa...!!!

Carlos M. Reis disse...

E o trailer meus amigos? É capaz de ser o melhor tudo. A abordagem ao público e não ao filme deixou-me logo com água na boca!

eradumvelhinho disse...

Eu não achei o filme o assombro de que se fala por aí, no entanto a tua crítica está excelente.

Esperava muito mais (talvez por causa do hype). Não é um mau filme. Nada disso. Acho-o médio. E em relação ao medo, confesso que só numa cena apanhei um susto. Será que só eu é que epnso que muitas das situações eram completamente previsíveis? A cam sem luz e quando volta algo acontece. A cam que vai ao sotão, faz 360º e aparece algo no final. O homem que está morto, mas afinal não está e desata a morder. Etc, etc. Não são estes "sustos" altamente previsíveis (nem que seja por muitos dos planos usados)?

Ps: Excelente o teu blog. Visita diária obrigatória.

Carlos M. Reis disse...

Este é um filme que também funciona conforme o contexto em que estiver a ser visionado. Numa sala de cinema, com apenas mais 2 ou 3 pessoas, à meia noite, acaba por resultar muito melhor do que no meio da tarde, em casa, com a namorada por exemplo. Quanto à previsibilidade, até concordo contigo. Muitas das cenas são previsíveis mas não são dadas: também só apanhei um susto ou outro, mas gostei do conceito e da maneira como a trama foi orquestrada. Obrigado pelas simpáticas palavras, espero-te por cá mais vezes ;)

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