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"Annie Hall" de Woody Allen é um filme paciente que baseia o seu fluir nos ingénuos mas divertidos e astutos diálogos e monólogos das suas personagens. Estreado num ano onde os blockbusters (como o primeiro "Star Wars" ou "Close Encounters of the Third Kind") predominaram, foi a simplicidade atrevida e irreverente de "Annie Hall" que levou o Óscar de Melhor Filme - Realizador, Argumento e Melhor Actriz Principal também - para casa. Um testemunho claro da sagacidade insaciável de "Annie Hall", onde Alvy Singer, um comediante judeu neurótico e hormonalmente desequilibrado e Annie Hall, uma citadina moderna mas algo imatura, partilham e examinam as suas experiências passadas e presentes.
E como em qualquer história romântica, só uma narrativa única, inteligente e altiva poderia elevar uma obra do género ao estatuto de culto que ainda hoje protege "Annie Hall". Mas mais do que isso, "Annie Hall" foi o filme que marcou a maturação definitiva de Woody Allen como realizador e comediante para o grande público. Isto porque conseguiu pela primeira vez aliar o seu humor característico ao drama e ao romance, em vez das comédias puras que até então protagonizara, como "Slepper", "Bananas" ou "Everything You Always Wanted to Know About Sex * But Were Afraid to Ask". Tudo embrulhado numa obsessão fascinante por Nova Iorque, um humor judeu auto-depreciativo e tendências neuróticas tão sublimes como presunçosas.
Repleto de "one-liners" que ainda hoje servem de referência a uma mão cheia de filmes, de cameos deliciosos como os Jeff Goldblum, Marshall McLuhan, Truman Capote, Paul Simon, a então desconhecida Sigourney Weaver ou Christopher Walken, - que, na minha opinião, faz parte da cena mais hilariante de todo o filme, quando confessa a Alvy Singer que quando conduz, tem vontade de chocar com as luzes que vêm de frente, perante o gozo de Alvy que lhe acena e afirma que gostou muito da conversa mas que agora tem que voltar ao Planeta Terra, só para segundos depois descobrir que é Walken que o vai conduzir a casa - "Annie Hall" é um dos mais raros exemplos de como podem co-existir de forma harmoniosa a comédia, o romance e o drama numa mesma película. Mesmo com uma narração algo confusa que não respeita espaços temporais nem limitações físicas, com moldes de sessão psicanalítica auto-reflexiva. Não fosse o seu final morno, longe da magnificência e da sumptuosidade da restante fita, e este poderia muito bem ser o meu "Allen" favorito. Assim sendo, fica lá perto.
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